Segundo Câmara Cascudo, meu pai “… não andou escrevendo sobre a Várzea do Açu. Andou filmando.
E com a mais sensível, delicada e fiel das máquinas: o coração”. Dedicou os melhores anos de sua vida à
Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, construindo a sede própria, hoje “Casa Manoel Rodrigues de Melo”.
Lá, organizou invejável biblioteca, onde intelectuais, estudantes e pessoas em geral faziam suas pesquisas.
Segundo seus amigos, meu pai construiu a sede da academia a pé e sem relógio, fato verdadeiro, pois
costumava marcar as horas pela posição do sol, andando sempre a passadas largas. Diariamente caminhava
da Academia para a Ribeira, subindo a ladeira da Junqueira Aires, chegando até o Café São Luis, ponto de
encontro com os amigos. No final da tarde, ainda passava pela padaria, antes de chegar em casa. Homem
simples e educado, recebia a todos que o procurasse, em casa ou na Academia. Quase todas as noites vinham
pessoas à nossa casa, para conversar e absorver seus ensinamentos, sua cultura e ouvir seus conselhos.
Segundo Tereza de Queiroz Aranha, amiga da família, Manoel Rodrigues de Melo era “doutor nato sem nunca
ter feito doutorado, era um autodidata”. A simplicidade era tanta, que só vim descobrir a real importância do
meu pai, no mundo literário, após sua morte. Muitas de suas obras foram citadas no exterior, segundo seus
estudiosos. Nunca foi homem de se vangloriar do que fazia. Exerceu o magistério por vários anos, lecionando
na Escola Normal, na época situada na Praça Cívica. Ficava muito feliz quando encontrava ex-alunas
exercendo a profissão. Após a morte da nossa mãe, fato que o abalou muito, ficou morando conosco, daí os
nossos laços se estreitaram ainda mais. Nesse período, apesar de fragilizado, participou do programa Memória
Viva, entrevistado pelo Prof. Alvamar Furtado e lançou nos jardins do Teatro Alberto Maranhão, o seu livro
Dicionário da Imprensa no Rio Grande do Norte 1909-1987, considerado por jornalistas o livro do século. Avô
extremoso, ajudou a criar e educar minha filha, sempre paciente, amoroso e atento. Quando tinha dúvidas no
estudo, a ele recorria, atendendo-a prontamente. Um dia falou orgulhoso: “essa menina vai longe”. Nos quinze
anos de Laurita, aproveitamos o momento para homenageá-lo também, demonstrando assim todo o nosso
amor, carinho e gratidão.
Na hora da valsa surpreendeu e emocionou a todos dançando à moda antiga, com seus oitenta e seis
anos bem vividos. Lembro-me que no dia seguinte, ele comentou: “Agora posso morrer tranquilo, dancei a
valsa com minha neta, publiquei meu livro e recebi meu título”, referindo-se ao Título de Doutor Honoris Causa,
concedido em 1995 pela UFRN. Após a sua morte, experimentamos um sentimento de desamparo. Apesar da
sua fragilidade, nunca deixou de exercer o papel de pai, avô, amigo e protetor. Com o passar do tempo, esse
sentimento deu lugar à saudade – uma lembrança terna e doce – de sua figura querida, sorridente, tranquila e
alegre. (Ligia Maria Rodrigues de Melo – filha).
“Meu pai, um homem ímpar, tinha uma maneira muito peculiar de transmitir amor, carinho, tranquilidade,
paz. Crescemos em um ambiente em que se respirava integridade e honradez. Apesar dos inúmeros
compromissos que tinha estava sempre presente no nosso dia a dia. Relembrando os tempos de meninice,
íamos nos fins de semana, de madrugada e a pé, à praia. Era uma alegria. Aos domingos, às vezes no almoço,
gostava de tomar vinho com minha mãe, fato este que deixou de fazer quando já éramos quase adolescentes,
para que não ficássemos viciados na bebida. Escritor e pesquisador nato, procurou incutir nos filhos o
compromisso com o saber. Lembro-me que, uma vez gazeei aula, mas tive o castigo merecido. Era uma figura
mansa e doce, mas sabia ser enérgica nas horas necessárias. Agradeço a Deus nos ter permitido uma longa
convivência com ele. Sei que lá do céu continua guiando os nossos passos”. (Vital – filho).
“Tive o privilégio de conviver por 15 anos com a bondade, a simplicidade, a inteligência e a lealdade
irradiadas pelo meu avô Manoel, através de palavras, atitudes e ensinamentos. Sempre atento e zeloso,
cuidava de mim, para que minha mãe fosse trabalhar. Nesses momentos fazíamos várias atividades, tais
como, assistir o Sítio do Pica Pau Amarelo na televisão e brincar de escola. Eu era a professora e ele o aluno e
assim de forma lúdica me incentivava no estudo. Me habituei a vê-lo todos os dias sentado em sua cadeira de
balanço, rindo, conversando ou lendo. Partilhar amor com uma pessoa tão maravilhosa como meu avô,
significou conhecer o sentido mais profundo da palavra felicidade. Expresso meus sentimentos com a estrofe
de um poema de sua autoria, retirada de uma de suas obras, intitulada, “Chico Caboclo e outros poemas”:
“Saudade – pensamento amargo e doce, Lembrança de algum bem que já acabou-se…Saudade é flor que
murcha no canteiro, Uma réstia de sol por sobre o outeiro”. (Laurita – neta).
“Fomos praticamente criados na casa do vovô Manoel. Convivemos com ele até os últimos momentos de
sua vida. Teve uma vida inteira dedicada à família, ao trabalho e ao estudo, não medindo esforços para que
nada nos faltasse. Exerceu as funções de pai, avô e amigo, estando sempre presente nos bons e maus
momentos. Sentimos muita falta das nossas conversas, dos ensinamentos e conselhos. Com relação aos
estudos sempre incentivava, para que no futuro tivéssemos condições de sobrevivência. Amante da leitura,
comprava livros de histórias e revistas em quadrinhos, para que nós criássemos esse hábito. Hoje, procuramos
repassar para nossos filhos tudo o que nos ensinou. Agradecemos a Deus a dádiva da convivência com este
Grande Homem, nosso avô, Manoel Rodrigues de Melo. Saudades eternas”. (Manoel e Sergiberto – netos).
“O nome para o meu batismo com Alda Leda foi escolhido por Mamãe, Papai e Tio Badéo – Manoel
Rodrigues de Melo. Tenho muito carinho e estima a esse homem que desde a sua infância e juventude soube
ser amigo carinhoso, responsável e atencioso com a nossa família, apesar de viver distante – Natal, enquanto
nós até 1942 estivemos no Bamburral – povoado de Pendências.” (Alda Leda de Melo Freire – sobrinha).
“Manoel Rodrigues de Melo – Quem foi esse homem no cenário cultural do RN? A construção da
Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, no decorrer de 20 anos, foi o segundo maior trabalho dele, depois
de publicar cerca de 7 livros e deixar outros inéditos, com recursos próprios, como resultado dos 40 a 50 anos
de pesquisas bibliográficas e no interior do Rio Grande do Norte. No perfil de Manoel Rodrigues de Melo
tivemos os fatores de causa e efeito, de forma direta e indireta, para que, atualmente a família Melo Freire
esteja com 11 jornalistas vivendo em Natal, sem contar outros de cidades diferentes, inclusive alguns que
desconhecem as obras escritas dele. Os sobrinhos de Tio Badéo, assim como os demais parentes que fizeram
a formação no Jornalismo, jamais foram em busca de sua orientação com esse fim, vez que na concepção
deles, a Comunicação Social deveria ser a melhor escolha para sua profissão. Nos olhos e na fisionomia, bem
como no sorriso e gargalhada dele – sempre houve os sinais de confiança, firmeza, admiração e tranqüilidade
nos raros contatos feitos por ele e outras pessoas, em sua casa ou nas ruas, falando sem orgulho e
prepotência, com simplicidade e segurança. Hoje em dia podemos ter a certeza de que temos a genética
cultural de Manoel Rodrigues de Melo, caracterizada pelo estudo e trabalho na Comunicação Social, através de
pequenos e grandes jornais, revistas e livros com os escritos deixados por ele, desde a juventude, quando ao
sair de casa em Pendências, para estudar e trabalhar em Currais Novos – RN fez 250 km montado em cavalo,
pensando no que estava para acontecer em sua vida, olhando e admirando o horizonte das serras, planaltos,
vales, rios e riachos secos, com árvores e arbustos da caatinga.
Durante aquela viagem – as lágrimas secas de Tio Badéo, por haver deixado Pendências com seus pais,
irmãos e amigos, eram enxugadas, não com o lenço de pano, mas, com a poeira do solo serrano, carregada
pelos ventos”. (Arlindo de Melo Freire, sobrinho).
“Manoel Rodrigues de Melo respirou literatura por toda a vida. Escreveu com facilidade as coisas dos
nossos rincões potiguares. Tornou realidade o sonho de construir a sede da Academia Norte-Riograndense de
Letras, a qual presidiu por duas décadas. Foi vereador em Natal em uma época em que o que mais valia para
o exercício do cargo era a honra. Contou coisas do Vale do Açu com a alma e o coração. Pena, que não é
conhecido pelas novas gerações. A marca registrada dele permanece em minha memória, ao voltar das aulas
vespertinas de inglês. Ali, na rua Mossoró, de paletó cinza escuro, trazendo o pacote de pão para o jantar. Era
um português de hábito parisiense, humilde, calado e eu, à escolta, sem dar uma palavra ou me aproximar.
Sabia que era meu tio-avô, que vira tantas vezes na varanda dos meus avós, na cadeira de balanço. Uma
entidade viva da cultura do Rio Grande do Norte a andar anônimo pelas artérias do centro da cidade. No dia de
sua morte, descobri que havia livro de sua autoria na Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, em
Washington, um intelectual mais reconhecido fora do que em sua própria terra. O povo desse Estado precisa
conhecer M. Rodrigues de Melo, como gostava de assinar seus livros. Ler sua obra é conhecer o nosso próprio
povo e sua história”. (Juliano Freire – sobrinho).